Disque Direitos Humanos registrou mais de 600 casos de racismo em 2018 05/07/2019 - 17:40
Queixas caíram 33% em um ano; especialistas atribuem queda a temor de perseguição e descrença em punição
O racismo , um problema histórico no Brasil, foi tema de novo levantamento do Disque Direitos Humanos, que recebeu 615 denúncias sobre discriminação racial no ano passado, segundo dados divulgados ontem.
Além da discriminação, também é comum a ocorrência de violênciapsicológica — xingamentos, entre outras hostilidades — e institucional, como abuso de autoridade.
O número de denúncias registradas em 2018 é 33% menor do que o visto no ano anterior, quando o Disque 100 recebeu 921 notificações. Não é, porém, um motivo de comemoração. Especialistas atribuem a queda ao modo de realizar denúncias e à crença de que elas não surtirão efeito.
— O racismo é cotidiano, e quem o denuncia pode pagar um preço alto por isso. Muitas pessoas não registram casos por receio de serem demitidas do trabalho, reprovadas na escola — explica Douglas Belchior, historiador e fundador do Movimento Uneafro-Brasil. — É um desgaste social, e conclui-se que não vale a pena lutar por isso.
Belchior avalia que, mesmo após a abolição da escravidão, a sociedade brasileira jamais conseguiu dar direitos iguais a negros e brancos.
— Espaços de dignidade e conforto são basicamente ocupados por brancos, enquanto a miséria e violência são majoritariamente associadas a negros — explica. — As políticas públicas sempre foram aquém do necessário para combater esta questão. Para solucioná-la, deve-se apostar em iniciativas que abranjam diferentes áreas, da habitação ao acesso ao sistema público de saúde.
Mais de metade (53,8%) das denúncias foi feita por pessoas entre 18 e 40 anos. Segundo o historiador, esta é a faixa etária em que a população está mais ativa em instituições de ensino e no mercado de trabalho, e, por isso, têm a "maior percepção da dor" provocada pela discriminação racial.
Frei David Santos, diretor-executivo da ONG Educafro, acredita que há subnotificação nas estatísticas de racismo porque a população negra não vê o combate às opressões ser levado a sério no Brasil:
— Já existe, há anos, a cultura do não denunciar. Isso vem da falta de confiança nas instituições. Boa parte das denúncias envolvendo matança e opressão contra a população negra não vai para frente no Ministério Público. Essa percepção aumentou ainda mais nos últimos anos.
Segundo o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, o governo federal investe em políticas de ações afirmativas, voltados, inclusive, para “povos e comunidades tradicionais ainda invisibilizados socialmente”, como aqueles de matriz africana e os indígenas.